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sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Abelardo e Heloísa, "Crônicas de Rubem Alves"

Abelardo e Heloisa

O romance entre Heloísa e Abelardo iniciou-se em Paris, Abelardo tinha 37 anos e Heloísa tinha 17 anos, quando se conheceram.

Abelardo, ao ver a jovem Heloísa, ficou encantado com a sua beleza, e tentou aproximar-se dela, pedindo ao seu tio Fulbert que o alojasse em sua casa, pois ficaria mais perto da sua escola, e não teria as preocupações de cuidar de uma casa, ficando com mais tempo para se dedicar aos seus estudos.

"Ela era bastante bonita e a extensão de sua cultura tornava-a uma mulher excepcional (...) eu a via assim ornada de todos os encantos que atraem os amantes".

O tio de Heloísa viu nesta oferta uma oportunidade para a sua sobrinha evoluir nos seus estudos. Assim, Abelardo tornou-se professor de Heloísa.

Todas as horas vagas que Abelardo tinha dedicava-as a ensinar Heloísa, inicialmente na presença do tio Fulbert. Algum tempo depois, Fulbert, confiando em Abelardo, deixava-os sozinhos.

Como Abelardo ensinava na escola durante o dia, dava aulas a Heloísa durante a noite, enquanto o seu tio Fulbert e todos dormiam.

Em pouco tempo, cresceu entre ambos um grande amor, deixaram de se preocupar com os livros e o estudo, fascinados um pelo outro, viviam esta paixão de forma intensa, trocando beijos, carícias, palavras doces e promessas.

"A ingenuidade do ancião deixou-me estupefato. Eu não me recobrava do meu espanto: confiar assim uma terna ovelha a um lobo esfaimado! Encarregou-me não apenas de instruí-la, mas de castigá-la sem reservas (...) Que mais teria a acrescentar? Um mesmo teto nos reuniu, depois um mesmo coração. Sob o pretexto de estudar, entregávamo-nos inteiramente ao amor. (...) trocávamos mais beijos do que proposições sábias. Minhas mãos voltavam com mais freqüência a seus seios do que a nossos livros (...) Para melhor afastar as suspeitas, o amor me levava às vezes a bater nela (...)".

Tanto Abelardo como Heloísa, eram dois intelectuais, e ao viverem este amor, sabiam os perigos que corriam perante a sociedade. Numa noite, o tio Fulbert descobriu o amor escondido entre Abelardo e Heloísa. Furioso, expulsou Abelardo de sua casa.

O amor entre Abelardo e Heloísa não diminuiu, começaram a encontrar-se nos locais que Heloísa podia frequentar sem acompanhantes; em sacristias, confessionários, catedrais. Heloísa engravidou, e para evitar um escândalo, Abelardo levou-a às escondidas da casa do tio Fulbert, para a sua aldeia em Palais, onde ficou aos cuidados da sua irmã, até dar à luz um menino, que Heloísa deu o nome de Astrolábio.

Abelardo voltou para Paris, para continuar a ensinar, mas não conseguia estar longe de Heloísa, como tal, foi pedir ao tio permissão para casar com Heloísa. Fulbert, embora magoado, consentiu o casamento. Heloísa deixou o seu filho com a irmã de Abelardo e dirigiu-se a Paris.
O casamento realizou-se durante a noite, às pressas e às escondidas, numa pequena ala da Catedral de Notre-Dame, sem trocarem alianças, nem um beijo, de modo a que ninguém desconfiasse.Só estavam presentes os familiares de Heloísa e alguns amigos de Abelardo.

Pouco tempo depois, o casamento tinha sido descoberto e Fulbert envergonhado, resolveu vingar-se de Abelardo. Contratou uns homens para invadirem os aposentos de Abelardo durante a noite e castraram-no. Assim aconteceu.

Abelardo na sua angústia e vergonha, obrigou Heloísa a ingressar no mosteiro de Santa Maria de Argenteuil. Heloísa tinha vinte anos. Na sua dor, Heloísa fez os votos monásticos e ingressou na vida religiosa, por amor a Abelardo.

Abelardo retirou-se para o mosteiro de Saint-Denis.

Durante muitos anos Abelardo e Heloísa não se viram, apenas trocavam cartas um com o outro. Nestas cartas Heloísa expressava toda a sua dor, pela triste sorte do seu amor, e toda a sua rebeldia, por ter ingressado na vida religiosa e ter vestido o hábito.
"Fujo para longe de ti,
evitando-te como a um inimigo,
mas incessantemente
te procuro em meu pensamento.
Trago tua imagem em minha memória
e assim me traio e contradigo,
eu te odeio, eu te amo."
Carta de Abelardo a Heloísa.

"É certo que quanto maior é a
causa da dor, maior se faz
a necessidade de para ela
encontrar consolo, e este
ninguém pode me dar, além de ti.
Tu és a causa de minha pena,
e só tu podes me proporcionar conforto.
Só tu tens o poder de me entristecer,
de me fazer feliz ou trazer consolo."
Carta de Heloísa a Abelardo



Anos mais tarde Abelardo construiu uma escola-mosteiro ao lado da escola que ele tinha dado a Heloísa. Viam-se diariamente, mas não se falavam, apenas trocavam cartas. Pois mesmo passados tantos anos, uma aproximação entre Abelardo e Heloísa era vista como uma tentação carnal, pois foram vítimas desta malvadez por inimigos de Abelardo.

Abelardo morreu em 1142, com 63 anos de idade. Heloísa mandou construir uma sepultura em sua homenagem. Mais tarde, em 1162 morre Heloísa e a seu pedido, foi sepultada ao lado de Abelardo.

Em 1817 os restos mortais dos dois amantes foram levados para o cemitério de Pére Lachaise.

Crônicas de Rubem Alves

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